“Lá vem o carro da Ceasa: só traz abacaxi e pepino!!!” É com essa frase que estão sendo recebidos médicos, enfermeiros e socorristas do Samu Natal nas portas dos principais pronto socorros da capital, como o Hospital Walfredo Gurgel e o Hospital Santa Catarina.
“Somos recebidos com hostilidade pelos profissionais dessas unidades, que não se conformam por levarmos os doentes aos hospitais”, explica o médico e coordenador geral do Samu Natal, André Pinto.
De acordo com o coordenador do serviço de urgência da capital, os hospitais sofrem com a falta de estrutura para receber os pacientes, que acabam superlotando os corredores. Por isso, a culpa frequentemente acaba recaindo sobre profissionais do Samu, que são acusados injustamente de contribuir para o caos.
“ A situação que já ocorria há algum tempo, se agravou depois da greve dos médicos”, explica Dr. André. Para ele, o que os próprios médicos desconhecem é que os chamados de urgência continuam acontecendo diariamente, e o Samu cumpre apenas a sua função, de socorrer, estabilizar e encaminhar os pacientes necessitados. “É preciso lembrar que não somos um atendimento hospitalar, e sim, pré-hospitalar, portanto, os doentes têm, necessariamente, que serem atendidos por uma unidade adequada”, afirma André Pinto.
Muitas vezes a hostilidade ultrapassa os limites éticos da profissão, e acaba com agressões verbais entre funcionários e médicos, que se recusam a receber os pacientes. As constantes brigas acontecem na frente dos pacientes e são diárias. Os relatos incluem desrespeito aos socorristas e dúvidas sobre a qualidade dos serviços prestados pelo Samu. Há casos em que as macas das ambulâncias ficam retidas por horas dentro dos hospitais, o que impede a saída dos socorristas. “Essa é uma forma de segurar a ambulância no local, e evitar que ela volte a trazer novos pacientes”, explica Rodrigo Lemos, supervisor do Samu.
A coordenadora de enfermagem do Samu Natal, Wilma Dantas, que já foi vítima de agressões verbais na porta dos pronto socorros, relata casos impressionantes em que pacientes graves, vítimas de AVC, foram deixados na ambulância enquanto os médicos dos hospitais, aos gritos, se recusavam a recebê-los. “Muitas vezes temos que buscar vagas em outros locais, já que a discussão se estende e ficamos preocupados com a situação de quem está dentro da ambulância”, reclama Wilma. Para convencer os pronto socorros a receber os pacientes, os socorristas do Samu se comprometem a levar o doente para outras unidades de internação assim que novas vagas apareçam.
“Não estamos conseguindo realizar o nosso trabalho e o nível de stress dos nossos profissionais está altíssimo. O que os funcionários dos hospitais não entendem é que não procuramos a demanda. Ela chega até nós, e temos a obrigação de atendê-la. Não dá para deixar uma urgência na rua”, observa Wilma Dantas.
Segundo a coordenação do órgão, o CRM tem sido comunicado sobre a recusa dos atendimentos por parte dos hospitais. A ação é uma forma de resguardar o serviço de urgência de casos algo mais grave que possam acontecer, como um óbito, por exemplo. “O CRM precisa estar ciente dos acontecimentos. É uma pena que um serviço essencial como o do Samu esteja sendo deixado de lado”, lamenta André Pinto.